Conto do Mês
A casa estava vazia quando ele chegou. Vazia de pessoas. O
branco das paredes reluzia por culpa do forte sol que adentrava pela janela,
caminhou até ela e a trancou. Agora estava tudo normal, trancara o sol do lado
de fora. Sentiu-se feliz por isso. Ele estava de novo em casa. Sim, dessa vez era
ele por inteiro.
Ela deixou os moveis velho, o micro-ondas que já não
funcionava, a grande geladeira que ganharam de presente de casamento... Nossa!
Há quanto tempo tinha se casado? Muitos anos respondeu sua mente cansada.
Restara-lhe uma mesa enorme onde era servida a refeição pontualmente todos os
dias, senão?... Senão?... Preferiu não completar o pensamento. Caminhou pelos
cômodos sentindo a perda de tudo que lutou para comprar, o seu radio,
televisão, sua churrasqueira velha e tantas outras coisas. Foi ate a sala e
encontrou seu sofá velho. Parecia miragem, marrom escuro, quase preto, quase
fantasia da sua mente. Sentiu o cheiro de mofo que emanava dele, mofo e álcool.
Álcool. Em silêncio deitou sobre seu pequeno sofá. Encolheu as pernas e ainda
assim se sentia apertado. Talvez fosse a angústia. Nenhum bilhete, nenhum recado,
nem mesmo uma satisfação. Não para o “ele por inteiro“. Talvez nunca fora
inteiro antes. Na verdade não era agora também.
Deitado em silêncio escutou passos leves de quem estava pronto
para aprontar, passos e cheiro de Kate.
--Kate sua sapeca!—levantou a cabeça à procura de sua filha. Ela não estava ali. Ela se fora e ele sabia disso. Fechou os olhos ainda mais cansado que antes. Sua preferida se foi pra sempre, Kate sua bebezinha. A preferida de sua sobriedade.
--Papai? – Escutou em sua mente, inalou profundamente o cheiro do sofá. Virou-se de costas para onde ficava sua antiga televisão de 20 polegadas, encarava o encosto do sofá quieto, quase de forma sombria. Não gostava de TV, ele gostava de álcool.
A.L.C.O.L.A.T.R.A. Escutou Tommy soletrar como fizera no concurso de soletrar que participara na escola, e que ele havia se esquecido de ir.
Sóbrio. Disseram que eu já podia ir para casa..., mas e essas vozes?
“Lembranças”. Sussurrou Lisey do andar de cima,
a voz rastejou pelo corredor do segundo andar e capotou pela sua escada degrau
a degrau ate enfim saltar aos seus ouvidos. Apertou com força sua própria
cabeça exigindo silêncio.--Kate sua sapeca!—levantou a cabeça à procura de sua filha. Ela não estava ali. Ela se fora e ele sabia disso. Fechou os olhos ainda mais cansado que antes. Sua preferida se foi pra sempre, Kate sua bebezinha. A preferida de sua sobriedade.
--Papai? – Escutou em sua mente, inalou profundamente o cheiro do sofá. Virou-se de costas para onde ficava sua antiga televisão de 20 polegadas, encarava o encosto do sofá quieto, quase de forma sombria. Não gostava de TV, ele gostava de álcool.
A.L.C.O.L.A.T.R.A. Escutou Tommy soletrar como fizera no concurso de soletrar que participara na escola, e que ele havia se esquecido de ir.
Sóbrio. Disseram que eu já podia ir para casa..., mas e essas vozes?
--ESTOU SOBRIO MERDA!!!!!!
Sentou-se agarrando suas omoplatas com violência, parecia
querer arranca-las, chorava balançando seu corpo para frente e para trás.
REPULSA! REPULSA!! Seu rosto encharcado era a prova da sobriedade, mas não
havia ninguém para testemunha-la. Não havia ninguém para abraça-lo e dizer que
o perdoava que o amava que ficaria tudo bem. Por isso cravava as unhas com toda
força que tinha em seus ombros. Sangrava. Punia-se. Fazia justiça.
--Não bata na mamãe!!!—gritava o Tommy em sua mente, um grito tempestuoso acompanhado de choro...
Caiu de joelhos com as mãos pressionadas no ouvido, amordaçando-o, sufocando-o. Sua respiração acelerava conforme as batidas do seu coração exigiam, curvou-se encostando sua testa suada no chão.
Abstinência? Isso é abstinência Deus? Deus não respondeu.
Não papai!!!!—Agora quem gritava era a Kate.
Arregalou os olhos debilmente encarando o piso empoeirado e pôde jurar que ela sussurra em seu ouvido. Aquela mesma voz doce que dissera sim no altar, a mulher a qual quase destruirá. Aquela que não o permitiria ser inteiro outra vez. –Culpa. – tão doce quanto chocolate ela sussurrou: culpa.
--Não bata na mamãe!!!—gritava o Tommy em sua mente, um grito tempestuoso acompanhado de choro...
Caiu de joelhos com as mãos pressionadas no ouvido, amordaçando-o, sufocando-o. Sua respiração acelerava conforme as batidas do seu coração exigiam, curvou-se encostando sua testa suada no chão.
Abstinência? Isso é abstinência Deus? Deus não respondeu.
Não papai!!!!—Agora quem gritava era a Kate.
Arregalou os olhos debilmente encarando o piso empoeirado e pôde jurar que ela sussurra em seu ouvido. Aquela mesma voz doce que dissera sim no altar, a mulher a qual quase destruirá. Aquela que não o permitiria ser inteiro outra vez. –Culpa. – tão doce quanto chocolate ela sussurrou: culpa.
Andorinhas e pardais espalharam-se assustadas a voar. Agora
era ele que gritava, o som aterrador assolava a casa com ecos forte e sentiu
vagamente sua mente se perder. Apagou.
Agora estava sentado na única cadeira que fora deixada para
ele. Uma cadeira velha de bronze, desconfortável e suja. Estava acordando
debruçado sobre sua enorme mesa onde almoçava e jantava... Era ali também onde
grande parte das discussões começavam e era ali que também se encerrava, sempre
com seu forte punho sobre a mesa, ou alguma coisa arremessada contra a
parede..As vezes um olho roxo..mas preferia
deixar essas lembranças presas no baú onde abrigava todos os seus podres.
-- É sua mente sóbria se livrando da culpa, assim diria o Dr. Joshuan.
Não precisou abrir os olhos para saber que não estava mais no chão fétido da sala. Sentia seu corpo pesado, queria apagar de novo, talvez para sempre, mas ainda era cedo para isso. Sua cabeça latejava a cada pergunta que sua mente fazia. Afinal de contas, como havia chegado ali? Não fazia ideia. Para dizer a verdade pouco se lembrava de horas antes de chegar em casa. Estava sóbrio e isso que importava.
--Estou sóbrio amor!—Imaginou-se falando, mas em momento alguma seus lábios de moveram para proferi palavras tão verdadeiras e fantasiosas.·.
-- É sua mente sóbria se livrando da culpa, assim diria o Dr. Joshuan.
Não precisou abrir os olhos para saber que não estava mais no chão fétido da sala. Sentia seu corpo pesado, queria apagar de novo, talvez para sempre, mas ainda era cedo para isso. Sua cabeça latejava a cada pergunta que sua mente fazia. Afinal de contas, como havia chegado ali? Não fazia ideia. Para dizer a verdade pouco se lembrava de horas antes de chegar em casa. Estava sóbrio e isso que importava.
--Estou sóbrio amor!—Imaginou-se falando, mas em momento alguma seus lábios de moveram para proferi palavras tão verdadeiras e fantasiosas.·.
O vento entrou pela brecha da porta abrindo-a por completo,
na verdade ele não só passou, mas trombou com a porta jogando-a contra a parede
com toda a força seguindo em direção ao homem debruçado na mesa, bagunçando
seus cabelos e enchendo seus ouvidos de terror e estrondo, o eco passeou por
toda a casa preenchendo o vazio que os moveis e pessoas faziam. O impacto da
porta na parede não fez apenas a casa estremecer, aquele que se dizia sóbrio
estremeceu junto e mesmo assim não levantou a cabeça. Nem mesmo depois de
escutar os passos embargados, quase tronchos do seu pai. Mas ofegou ao sentir
aquele cheiro. Um estalido na mesa e lá estava ele. Álcool. Seu pai se fora,
nunca esteve ali. Só aquelas palavras sussurradas ao pé de seu ouvido, suaves e
cortantes: Tal pai, tal filho! Isso não acaba nunca!
Com a cabeça erguida ele encarava aquele litro que diversas vezes estivera em sua mão em noites de frio ou calor, natal ou ano novo. Todos os dias. Sua bebida favorita, se é que existia isso agora. Naquela festinha há 30 anos provara seu primeiro copo de cerveja.
--É só curtição coroa.
Agora aos 46 já havia experimentado de tudo, bebidas quentes, chiques, baratas, misturas diversas e pra ser sincero, tanto fazia para ele tomar um vinho de 200 anos ou uma cachaça de 1.30. O que o satisfazia era saber que ele estava lá. O álcool.
Estava lá, sem marcas, intactas e tão limpa que chegava a
brilhar. Como dizia seu pai, estava pronta para o arremate. Esticou os braços
em direção a ela esvaziando sua mente de questionamentos, hesitou apenas ao
toca-la. Suava frio. Sentia seu corpo morrer. Com os olhos esbugalhados e a
boca já aberta deixando escorrer um filete de saliva, ansiava debilmente por
aquele gosto. Agarrou e a puxou para si. Fechou os olhos. É o fim. Com certeza
é o fim.
Destampou a garrafa ainda de olhos fechados, desenroscando
ela bem devagar, tão concentrado quanto um artesão. Aberta exalava seu aroma
forte e instigante. Serrou os lábios. Estava sóbrio, por isso chorava. Queria
redenção, mas seu corpo queria álcool. Queria encerrar com seus dias de
sobriedade. Sentiu que não poderia abrir
mão de sua companheira de tantos anos. Nossa! Eles estavam juntos antes mesmo
de conhecer sua mulher, antes dos filhos e até antes do seu emprego de merda. E
por que todos queriam terminar com parceria tão antiga? Ele sabia a resposta,
mas as jogou no baú.
Antes de tudo se ruir: casamento, relacionamento com amigos e filhos. Ele resolveu culpar sua companheira, afinal ela não podia responder no momento. Depois que todos se foram ele se agarrou a sobriedade e terminou sua velha amizade com o senhor álcool. Mas agora ele estava ali, em suas mãos dizendo que o perdoava que o amava e que nunca mais o deixaria partir. Ele podia escutar e jurava que o seu amigo chorava junto a ele. Mas estava sóbrio e estava realmente arrependido. Não queria pedir perdão a ‘’ele”. Ele estava de partida.
Antes de tudo se ruir: casamento, relacionamento com amigos e filhos. Ele resolveu culpar sua companheira, afinal ela não podia responder no momento. Depois que todos se foram ele se agarrou a sobriedade e terminou sua velha amizade com o senhor álcool. Mas agora ele estava ali, em suas mãos dizendo que o perdoava que o amava e que nunca mais o deixaria partir. Ele podia escutar e jurava que o seu amigo chorava junto a ele. Mas estava sóbrio e estava realmente arrependido. Não queria pedir perdão a ‘’ele”. Ele estava de partida.
Com seu amigo nas mãos, se levantou andando em direção à
cozinha, passava a mão por todas as extremidades do litro. Queria pedir perdão
aos seus filhos. Acocorou-se junto ao lugar onde antes havia um fogão e pode
sentir o gosto da torta de amora de sua mulher.
-- Mais um pedaço amor.—sorrio.
Acocorado erguera o litro aberto como um pai ergue seu filho. Queria pedir perdão a sua mulher. Virou o litro em direção a sua cabeça entornando toda a bebida, se é que era mesmo bebida, ensopou-se dela. Gasolina. Cheirava a gasolina. --O fogo purifica tudo meu filho! Escutou sua mãe. Levou suas mãos ate dois fios desencapados e juntou-os fazendo-os faiscar.
O fogo purifica... Sentiu o corpo arder em chamas, fechou os olhos e sorriu como um vencedor.
-- Mais um pedaço amor.—sorrio.
Acocorado erguera o litro aberto como um pai ergue seu filho. Queria pedir perdão a sua mulher. Virou o litro em direção a sua cabeça entornando toda a bebida, se é que era mesmo bebida, ensopou-se dela. Gasolina. Cheirava a gasolina. --O fogo purifica tudo meu filho! Escutou sua mãe. Levou suas mãos ate dois fios desencapados e juntou-os fazendo-os faiscar.
O fogo purifica... Sentiu o corpo arder em chamas, fechou os olhos e sorriu como um vencedor.
Não estava sóbrio. Estava jogado no asfalto. O asfalto
queimava suas costas, o sol mal o deixava enxergar direito. Estava com sede,
tentou se levantar, mas seu corpo não respondia. Sua cabeça sangrava enquanto
um rapaz dez anos mais novo falava ao celular desesperadamente. Sombra. Uma
multidão o rodeara e o sol não mais o atrapalhava. Sentiu sua respiração
enfraquecer, sua língua estava tão enrolada. Quanto havia bebido dessa vez?
Sabia que não passaria dessa. Atropelado como um cachorro de rua. Queria pedir
perdão. Sentiu sua vista embaçar, a multidão se abriu. Lá estava ela. Aquela
que dissera sim no altar, aquela que quase ruiu. Junto delas sua preferida e o
seu amado filho. --Deus me deu a chance e se esforçou a pedir perdão. --pensou.
E nada saia de seus lábios além de um som desentoado e bêbado. Fracassou ate no
ultimo instante de vida, assim como seu pai.
Aqueles que o amava estavam bem mais próximos, mas ele não
conseguia identificar seus rostos, nem os escutava. Sentiu a cabeça adormecer. Do
seu lado sabia que estava seu companheiro de anos, aquele que o impedira de
viver plenamente. Aquele que o impedira de pedir perdão. Seus olhos perderam o
brilho. Do outro lado ela vinha, sem que ninguém notasse. Vinha com sua foice,
seu manto negro. Ela dançava. Ele sabia que vinha busca-lo. Ela era ruiva. Ela
era a morte. E sem perdão, sem redenção, sem sobriedade. Exatamente como um cachorro
de rua “ele foi embora”.
Muller da Costa Rocha Gomes
triste realidade tantas vezes repetida... Muito bom o conto
ResponderExcluirgostei do conto
ResponderExcluirsituação que identifica muito na vida das pessoas !
o mais incrível desse conto é que ele poderia ter vivido tudo o que estava em sua mente,mais não viveu por que a bebida lhe tirou tudo.
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